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Depois de uma década frequentando retiros espirituais e de meditação, eles já não são exatamente uma novidade para mim — a não ser que tenhamos em mente o fato de que nenhum retiro é igual. No entanto, eu me senti uma novata no último retiro de silêncio com meu Mestre. Foi a primeira vez que passei quinze dias imersa, de corpo e alma, na experiência de permanecer em silêncio. Em outras palavras: foi minha primeira vez totalmente dedicada a me ouvir, interpretar e me compreender. Foi a primeira vez que explorei uma caverna: meu coração. Meu desaprendizado de certas coisas foi a chave que faltava para abrir o cadeado que protegia o acesso ao meu inconsciente, para derrubar paredes e encontrar o fundo falso que escondia importantes verdades.

Talvez você, assim como eu mesma já fiz, pense: “Já fiz isso! Já passei alguns dias em silêncio.” Ou mesmo: “Passo o dia basicamente sozinha e, portanto, permaneço em silêncio.” Tudo bem. Mas você já ficou realmente em silêncio?

O primeiro dia em um retiro onde você já esteve e com pessoas que você já encontrou antes é, principalmente, para colocar a conversa em dia. Entre abraços, risadas e compartilhar, nós todos reconhecemos uns nos outros o amigo ou amiga que não víamos há quase seis meses. Alguns chegaram com notícias surpreendentes, outros ficaram mais… “Ah! Tudo na mesma.” Enquanto essas horas passavam, fomos preparados para mergulhar no silêncio.

Quando as montanhas ainda bloqueavam os raios do sol, já estávamos de pé e bem despertos no templo, meditando. Dinamicamente. Seguindo orientações deixadas por Osho e o conselho de nosso Mestre vivo, o grupo de mais de cem Sannyasins — esta que vos escreve incluída — começou a respirar caoticamente. Sem ritmo, sem expectativas, sem regras, apenas sentindo o ar entrando e saindo do nariz, queimando as narinas e limpando o caminho de e para os pulmões, sentindo o calor e o frio de um tanto de energia boa. Quando a música mudou não pudemos nos segurar, começamos a gritar. Com toda força, berramos, gritamos palavras, nos movimentamos do jeito que o corpo nos fazia mexer durante dez minutos catárticos, deixando tudo sair. Então a música mudou novamente para nos fazer pular sobre os pés planos, braços para cima, deixando sair o mantra “Hoo”, até que uma voz nos avisou: “Pare!” E como crianças brincando, congelamos. Na posição em que estávamos, apenas paramos e permanecemos daquele jeito, assistindo, observando, sentindo as ondas que atravessavam o corpo físico e o sutil. Desapegando da mente, que gosta de nos dizer que estamos cansados e não conseguiremos permanecer em uma posição por muito tempo. Mas a gente consegue! A gente consegue fazer isso. Porque estamos no comando e nada é mais importante do que sentir e seguir o coração, apenas testemunhando o poder e a energia do momento. Até que outra música começou e simplesmente deixamos o corpo solto fluir no ritmo, como um pássaro cortando o céu, asas abertas, sem bater, sem preocupação, apenas sendo.

Seguida de silenciosa meditação do trabalho — para alguns significava rastelar o jardim, para outros cortar legumes e havia aqueles que limpavam o restaurante e/ou a cozinha, apenas para citar algumas atividades —, Meditação Kundalini, Meditação da Respiração nos Chakras e grupos para exploração da pergunta de ouro feita por Bhagavan Sri Râmana Mahârshi, “Quem sou eu?”, a Meditação Dinâmica de Osho compôs o cronograma bem organizado que nos permitiu mergulhar fundo e voar alto, silenciosamente, em busca da verdade. Mas nada disso funcionaria tão bem sem o evento mais importante da programação: Satsangs. Sentar em silêncio, coração aberto, ouvindo nosso Guru é essencial para o crescimento espiritual, ou despertar.

Penso que é incrível a maneira como podemos aprender com as diversas leituras disponíveis a qualquer momento, em qualquer lugar. Não há limite para a aquisição de conhecimento. No entanto, estar próximo de um Mestre vivo torna a jornada um prazeroso passeio pelo campo, sem qualquer dúvida. Você apenas segue os passos, observando o que está ao redor. De repente se dá conta de que, quando nada há para dizer, não há necessidade de falar. E na maioria das vezes, nada há para dizer. Vida e Amor permeiam completamente um relacionamento como esse, que nos chacoalha, acorda e move. Alimenta algo que gosto de pensar serem asas; mas isso também nos proporciona raízes — voamos alto e mergulhamos fundo.

Em quinze dias desaprendi tudo o que a sociedade me forçou a aceitar. Foi como deixar o dedo na tecla deletar, por dias, e depois olhar no espelho para descobrir que sou uma página em branco, a ser escrita agora. Há apenas um momento em que posso escrever nessa página: Agora. Há apenas um momento em que posso ler essa página: Agora. Eu sou agora.

Desaprendi qual é o rosto do meu ego. Eu virei do avesso. Quebrei e abri a casca; toquei a parte mais interna do meu ser. Parece que não há volta, a menos que eu volte a dormir. Porque dessa vez, eu realmente permaneci em silêncio. Não foi apenas calar a boca, mas sim, o foco estava em silenciar minha mente ou as vozes que não pertencem ao meu coração; foi fazer calar o ego.

Desaprendi toda a competição que fazem a vida se tornar e que nos acorrenta a mentiras que acabamos por viver pelo bem de uma imagem que nos esforçamos para fazer caber na tela de um mundo ficcionalizado que nós todos, juntos, criamos.

Desaprendi a forma do singular e me dei conta de que pensar em termos de “o outro” é segregar. Já passou da hora de abrir mão dessa linguagem divisora e compreender que tudo se trata de “nós”, não de “eu + ela/ele”. Mas primeiro, é necessário que se trate da personalidade, do self, não do ego — muito menos da selfie. Primeiro e acima de tudo, povoar-se de si mesmo. Desapegar-se do ego. Fazer contato com quem você é e Amar quem você é. Somente então será possível “amar ao próximo como a si mesmo”.

Desaprendi uma das mais cruéis lições que me ensinaram: como matar meu primeiro amor, o Amor que eu deveria ter alimentado desde o primeiro dia em sociedade, que é o Amor por minha natureza. Porque não há música mais bonita do que o silêncio da natureza, da minha inocência, do meu “bem-infantil”. E é nesse espaço que criei — sagrado e seguro — que posso alimentar o Amor pela humanidade e compaixão e construir compreensão. Esse é o real sentido de comunalismo. Isso é o verdadeiro Amor. E ele começa de dentro, então transborda, toca e conecta vidas. Somos todos e todas seres compartilhando existência.

Apesar de estar em silêncio, desaprendi a ficar calada e com medo. Minha voz é a que vem do espaço silencioso do meu coração; é minha verdade, meu ser. Ela não sai apenas em palavras. Caso contrário, seria apenas bobagem. Minha voz é minha ação, totalmente em harmonia com meus pensamentos. E desaprendi a fé, junto com o significado de Deus, como eles nos ensinam. Porque somos todos, e cada um, “o oceano inteiro dentro de uma gota”. O que quer que eu faça comigo mesma, faço com o Universo, e vice-versa. Sou quem quer que eu for no momento; mas também sou as vidas que me rodeiam, homem e mulher, sublime e grotesco, bem e mal. Desaprendi o meu lugar dentro de uma caixa.

Há um Deus em mim, em você, em todos nós, que é nossa natureza divina. Somos todos responsáveis pelas vidas que todos, juntos, temos vivido. E quanto mais disseminarmos o assassínio do primeiro amor, mais tornaremos a humanidade miserável. É incumbência de cada um de nós mudar; ou ainda, parar esse jogo de sofrimento e aceitar a liberdade. Nascemos livres. Quanto mais damos ouvidos aos sons de fora, mais deixamos de notar o que acontece dentro. É quando estamos realmente em silêncio que nos conectamos, com compaixão, Amor, respeito e cuidado.

Paz, Amor e Vida para todo mundo,

Bhuvi ♥︎

Você não é uma gota no oceano. Você é o oceano inteiro dentro de uma gota.

rumi

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8 thoughts on “O que desaprendi em quinze dias de silêncio

    1. Olá! 🙂
      É possível, desde que as pessoas estejam bastante concentradas no objetivo de se retirar, ou seja, sair desse mundo e explorar o espaço interno. Nesse caso, é importante desligar telefones, interfones, televisores, internet e quaisquer meios de distração, e criar um cronograma para desenvolver a prática. No entanto, nada melhor do que se retirar de verdade! E buscar um ambiente mais próximo à natureza, silencioso — isso no caso de você morar em um centro urbano –, afinal, a energia é bem diferente e os benefícios para a alma e o corpo são imensos.
      Um grande abraço!

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